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Grafite

“O Cinza Grafite da Bárbara veio da sua conexão com desenhar e o que a principio era apenas um nick para uma rede social foi virando mais e mais sua identidade. Hoje em dia o Grafite já tem varias nuances, intensidades e significados.”


Você tem uma cor que você sente mais conexão?


Eu tenho uma certa identidade com a cor cinza, eu escolhi quando eu tinha uns quatorze anos para fazer a minha conta no DeviantArt. E foi um negócio que não faz muito sentido, porque foi o resultado de um baita brainstorm que eu fiz com um amigo, o Lião, mas a ideia do cinza vinha do fato de que eu desenhava muito com grafite. Os desenhos eram simples e então essa coisa assim do Cinza acabou até virando um pouco da minha identidade.


Era um Nick (femme-en-gris) que fazia muito sentido na adolescência que significa mulher em cinza. Porque eu estava num processo de não querer ser menina, criança. Então mulher ali não era no sentido de ser feminino, era no sentido de ser adulta. Mas hoje em dia é meio esquisito, porque “femme“ no meio lésbico é gíria para lésbica feminina, e não é uma coisa com a qual eu me identifico. Assim eu não sei como que eu apareço para os outros, mas eu me sinto mais assim, mais puxando para “butch” ou algo mais andrógeno.


Você consegue lembrar quando que você começou a se explorar e sentir confortável pra ser quem você é?


Foi quando eu entrei no Coltec, eu acho que eu era muito infeliz na escola anterior, mas no Coltec, era um monte de gente esquisita que nem eu. Eu acho que tive uma fase que era quase uma das pessoas populares, tipo. É que assim, eu tinha muitos amigos lá. Então eu me senti e eu passei a me sentir mais confortável comigo mesmo lá.


A exploração da minha sexualidade foi mais tarde e teve muito a ver com a minha amizade com a Denise. Ela era muito animada e ia muito em baladas gays. E apesar de ter demorado para começar a encontrar outras mulheres que não eram heterossexuais nesses lugares, essa coisa da heterossexualidade ser muito a norma começou a se desfazer aí.


Eu sou de Belo Horizonte em todos os sentidos, eu nasci aqui, eu cresci aqui. Eu vivi um total de 1 ano e meio fora de Belo Horizonte de todo o total da minha vida. E a maior parte desse um ano e meio não foi agradável.


Eu fiquei um semestre em Montreal, lá foi legal, mas eu fiquei um ano em Ouro Preto na UFOP. E lá foi muito ruim, olhando assim para trás, é que na época eu não me dava tanta conta assim. Mas eu achava que tinha mais a ver com uma questão meio de classe assim. Porque, não sei como que tá hoje com o SISU hoje em dia, mas antigamente, a sensação que eu tinha é que quem fazia vestibular para essas faculdades do interior era mais a elite do interior. Então era uma galera muito conservadora, muito conservadora. E aí chegavam lá os jovens dessa elite conservadora querendo subverter e dar a louca, só que de um jeito conservador.


Na minha primeira noite na república em Ouro Preto, uma das moradoras antigas contou um caso de uma amiga de infância dela que tinha se assumido como lésbica. Não lembro bem a história, mas parece que o grupo de amigas delas ia a algum lugar e estavam com dois carros, um dos quais era o da moça lésbica. A moradora da república se recusou a entrar no carro com a amiga lésbica e, no fim das contas, um carro foi cheio e o da moça lésbica foi vazio porque nenhuma das amigas de infância queria ir com ela.



Eu fiquei horrorizada quando ouvi isso. Eu tinha 18 anos e ainda tinha muitas inseguranças sobre a minha sexualidade. Se ela tinha ficado daquele jeito com uma pessoa que ela conhecia desde criança, imagina com alguém que ela tinha acabado de conhecer? Foi uma das coisas que me incomodou pelo resto do meu tempo lá, e que me fez resolver "sair do armário" com meus amigos de BH, mesmo ainda estando em um momento de autoconhecimento, ainda muito inexperiente e com muitas dúvidas. Queria ter certeza de que poderia confiar nos meus amigos, e já cortar da minha vida qualquer pessoa que não me aceitasse.


Como que é para você agora viver com sua cor Grafite?


Atualmente eu me sinto meio que numa “zona cinza”. Não sei. Acho que teve momentos em que eu me que eu me sentia mais livre, mais a vontade. A pandemia e todo esse processo dos últimos anos mudou um pouquinho, acho que mudou a vida de todo mundo, não é? E isso mudou um pouquinho o jeito como as minhas relações estão estabelecendo.


E vem mais dessa questão do isolamento, sabe? De ficar muito presa perto da família, talvez. E eu gosto muito da minha família, mas não é um espaço em que eu me sinto à vontade que nem quando eu estou mais entre os meus amigos.


Eu acho que eu estou atualmente também um pouco com saudades da universidade, sabe? Eu me sinto muito bem quando estou na Universidade porque é um ambiente que as pessoas tentam ser minimamente de cabeça aberta, né? Elas não são 100% tolerantes, mas as intolerâncias delas são mais fáceis para mim, para lidar.



E qual um desejo seu para um mundo mais colorido?


Eu gosto de política, não é? E eu tenho um lado muito concreto, como estou abraçando o cinza porque a gente não pode abraçar esse desejo para um mundo mais concreto?


Nesses dias frios assim, o meu maior desejo mesmo era que tivessem menos pessoas dormindo no cimento da calçada e passando frio nesse nessas noites que está fazendo 4° de madrugada.


Então acho que se tivesse menos pessoas nesse cinza específico, da rua, já seria uma baita mudança positiva com o mundo.


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