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Rubro e Libre

O Vermelho “Rubro e Libre” da Marina sempre esteve presente na sua vida, um vermelho assertivo, seguro de si e que permanece diariamente lutando pelo direito de continuar sendo quem é.


Essa coisa de esquerda comunista, socialista sempre esteve muito presente na minha vida. Vem dos meus pais, da minha criação, então faz parte de mim.


E já que estamos aí falando de cor, o vermelho tem sido uma cor constante pra mim. Não sei se é só uma coisa de alinhamento político, mas representa bem essa coisa de me posicionar de forma ativa. E, coincidentemente (será?), também é uma das cores dos meus orixás. De Iansã e Xangô.


Eu estudava em colégio católico, e lá em casa todo mundo é meio comunista, né?. Aí eu ficava vendo esses “dois mundos” e pensava que muitas coisas na escola não faziam sentido. Acho que isso era uma das coisas que ajudavam no sentimento de não me encaixar muitas vezes também, sabe?


Tem um caso que meu pai foi na reunião de pais porque a foto da primeira comunhão custava sei lá quantos reais, e meu pai levantava a mão lá no meio e fazia a gente passar vergonha, falando que isso era uma coisa capitalista. (risos)


Ser essa pessoa sempre foi parte de mim, da minha identidade. De ser essa pessoa de esquerda. Estampada na cara que é sapatão e de esquerda, graças a Deus.

Eu inclusive agradeço aos meus pais no meu santinho da formatura da faculdade. Era tipo assim: aos livres e rubros valores dos meus pais. E mandei para alguns amigos da minha mãe. Aí teve um amigo dela que mandou um bilhete: os rubros agradecem. Super comoção.


Mais cedo você falou de não se encaixar, você pode falar mais um pouco disso?


Quando eu era criança tinha uma coisa muito curiosa de como eu via o romance de desenho animado, porque eu me colocava no lugar do príncipe. Não como uma coisa do gênero, mas como uma coisa de fazer o par com a princesa.


O gênero nunca foi uma questão, mas essa coisa de performar muito a feminilidade que as pessoas esperavam não era pra mim.


Essa coisa feminista sempre fez parte de mim. Já era muito meu antes mesmo de ler, prestar atenção, ouvir, estudar, sabe? Nunca fez sentido para mim vestir uma coisa que as pessoas quisessem que eu vestisse ou me portar do jeito que as pessoas quisessem que eu me portasse.


Já sofri com isso, em algumas ocasiões, mas, ainda assim, nunca fez sentido. Nunca achei que eu tinha que mudar. Às vezes achei (risos) mas muito pouco. Era uma coisa meio: não sou eu. Não, não cabe para mim. Não preciso fazer isso, não.


Com isso, eu tentava ficar no time mais do canto para não sofrer o bullying. Mas tentar encaixar, do jeito que as pessoas queriam, tentei muito pouco.


Eu era a pessoa tímida no canto até que eu fui pro ensino médio, no Coltec. E foi bacana, foi um lugar de encontrar esquisitos. Ir pra um lugar sem muita cobrança, sabe? Enfim, era fácil ser mais eu. Não tinha essa cobrança heterossexual topzera no ambiente.


E como foi sua experiência no Coltec?


Lá eu tive meu primeiro relacionamento com uma menina. Que era evangélica - não sei se é até hoje -, mas ela era muito evangélica - de cantar e tocar na igreja.


Na época foi muito sofrido. A gente deve ter ficado juntas quase 3 anos - do Coltec até meu início de faculdade. Ela tinha uma amiga, também evangélica, que percebeu tudo. Então essa pessoa ficava igual um urubu com a gente. E ainda tinha o pai dela também, super rígido.


Aí esse “namoro” andava muito devagar, um passo pra frente e dois pra trás. Cada beijo que a gente custava a dar era pecado. Nos afastávamos. Aí nos reaproximávamos, ficávamos juntas, era pecado não podia, afastava... Muitas vezes isso. Foi bem sofrido.


Eu cheguei a falar pra ela assim: Eu não tenho problema nenhum com a homossexualidade, eu não tenho problema em viver isso. E aí nesse dia, depois que eu falei isso, ela deu uma surtada: "Nossa, mas você tá querendo namorar comigo?" Como se já não fosse isso…


Tudo com aquele sofrimento da adolescência que não sabe resolver as coisas. E aconteceram alguns episódios em que eu falei: Eu não tenho saco para isso mais! Um deles foi quando o Amaranto, um banda aqui de BH que eu amava, lançou um CD novo e a segunda música era Estrela de Oxum.


Chamei ela pra ir lá em casa ouvir o CD. A gente estava ouvindo o CD e ela falou assim: não gostei dessa música. E aí começou uma ladainha de preconceito com outras religiões, bem chato.


Por fim eu entrei pro grupo de teatro da faculdade e aí fiquei meio vida louca assim, e ela continuou com umas picuinhas “cristãs”. Foi então que eu vi que não tinha jeito mais. Terminamos. Sofri horrores. Foi um daqueles términos bruscos, de não querer ver nunca mais, por não dar conta. Que se eu fosse ver, ia voltar e ia ficar essa novela pra sempre.



E como foi o processo de descobrir a sexualidade dentro da sua casa?


Ai esse caso de como eu contei para minha mãe é bom demais! Era minha formatura da faculdade e eu tinha uma namorada na época, mas ainda não tinha contado nada lá em casa.


E não tinha contado porque não tinha muito porque mesmo, eu sabia que seria muito tranquilo, né? Minha mãe já tinha saído na parada gay em cima do trio elétrico. E do meu pai eu já ouvia falas maravilhosas dele com os amigos do meu irmão. Tipo que um amigo tava falando de forma pejorativa que fulano é gay e o meu pai defendendo “E daí? Que que isso tem de estranho? Que que isso tem a ver com você?”


É, meus pais são ótimos.


Aí nessa época, um amigo meu viajou e deixou a chave do apartamento dele comigo, que era para eu aguar as plantas. E ficamos eu e a namorada indo muito pra casa dele - que ela morava na casa da tia e eu morava lá em casa, né? Então, toda hora eu falava “vou lá na casa do Boy”.


Aí, um dia, eu tava lá vendo as fotos da formatura. Chega minha mãe e pergunta do nada - e ela nunca assunta nada, mas nesse dia perguntou - “toda hora você vai lá na casa desse Boy, vocês estão namorando?” Aproveitei a deixa e falei: não mãe, o Boy é gay, eu estou namorando essa daqui, ó. E coincidiu que a tal namorada tava na tela.


Daí a minha mãe respondeu “Ah, tá! É que eu tô cozinhando uma mandioca ali, deixa eu ir ver” e saiu. E ela tava mesmo! (risos)


Essa história é muito boa. Depois ela voltou e me abraçou. Perguntou se eu tava feliz. Falei que tava sim. E tudo bem.



E você com você atualmente? Como que você está?


Olha, atualmente to bem lésbica futurista, sapatona convicta. Zero dúvidas, zero arredando pé. Muito convicta. Zero fazendo concessões para o conforto do outro.


Curtindo a vida adoidada, porém não muito porque que já tô velha (risos).


Atualmente namorando uma carioca de esquerda feminista virginiana muito maravilhosa. Que sorte a minha!



Por fim, qual um desejo seu pra um mundo mais colorido?


Eu não sei. Primeiro a gente tem que salvar o planeta, né?. Aí depois botar os fascistas dentro na caixinha de novo...


Seria ótimo se geral entendesse que não é normal matar o outro só pelo que se é...

Distribuir renda, acabar com a fome, dar dignidade pras pessoas... enfim, o fim desse capitalismo mesmo.


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